quarta-feira, maio 31, 2006

Momento Musical: Chico, Nando e Nick

Momento Musical: Chico, Nando e Nick

Não confio integralmente nessa áurea que existe em cima de certos artistas, que preestabelece que tudo que eles fizerem será genial, mas claro que um bom currículo pesa - e muito! Na mesma forma não vejo com bons olhos os chatinhos e agourentos de plantão que atestam que ninguém é capaz de fazer melhor do que já fez um dia, porque o que é bom mesmo é o passado dos que ainda permeassem ou o novíssimo dos que está chegando. Atualmente, não tenho lá muita vontade de ficar catando banda nova por aí, acho que por causa das minhas experiências que não foram lá muita satisfatórias. Tudo que estava ouvindo - que era dito como a última coca-cola do deserto ou coqueluche do momento - para mim era anti-tesão total, salvo rara exceções. Enfim, no momento, quero falar é de três das antigas mesmo.

Começaremos por Chico Buarque e seu recente Carioca. A cada audição eu me deparo com algo novo, seja um efeito sonoro, um barulhinho bom ainda não percebido, algum instrumento, algum acorde que, na minha ignorância, não consigo distinguir a procedência, seja na genialidade das letras, e o modo que elas se encaixam nas melodias. O Rio de Janeiro está em todas as faixas, seja sendo exaltado, criticado, servindo de cenário ou até mesmo de referência musical, por isso o cd é Carioca da gema. Para os saudosos de Chico da época da Ditadura, em Subúrbio e em Ode aos Ratos está presente a crítica social e política. Aliás, Ode aos Ratos vem a ser uma das minhas preferidas do cd, a embolada-rap a la Buarque no meio da música é sensacional. Por falar nas preferidas, o samba Dura Na Queda também entra na minha lista. Mas, tudo no cd é belo: o ar juvenil de Imagina e As Atrizes, a sedução feminina cantada em Renata Maria e Ela Faz Cinema, a melancolia implícita de Bolero Blues, o romantismo explicito de Porque Era Ela, Porque Era Eu, e por aí vamos... Como se só o cd já não fosse mais que o bastante, ainda tem o dvd Desconstrução. O documentário vai além do making of, ele nos mostra uma pequena parcela do processo de trabalho de um Chico, super a vontade com as lentes. Igualmente ótimo!


Assim como Chico, Nando Reis sofre criticas por causa da sua voz chinfrim. São vozes peculiares, que podem não ser das mais extraordinárias, mas fazem bonito, pelo menos a mim agradam. Nando é ruivo, e segundo uma das minhas teorias, essa característica predispõe um certo grau de insanidade, fermento para sua arte. Porque colecionar caramujos quando jovem, convenhamos, não é algo como colecionar figurinhas. Falo dos caramujos, pois eles se fazem presente no novo cd de Nando, Sim e Não. A capa teve o design modernoso e colorido baseado nos seres rastejantes, assim como a ótima e polêmica Monóico, musica que joga com a idéia que o titulo sugere - seres que apresentam órgãos sexuais dos dois sexos. O clima do cd está mais para a própria Monóico (com uma pegada mais rock) do que para a valsa Ti Amo, o quê também difere dos seus trabalhos anteriores, mais ligados a sonoridade mpbiana (seja lá o que isso for). Violões ainda estão bem presentes, principalmente nas levadas das canções, mas o cd é mais animadinho mesmo, talvez por mérito d'Os Infernais, banda que toca com ele. Na real, não deixa de ser o pop romântico de Nando Reis. Quanto as letras, me parecem um tanto quanto autobiográficas, não sei, suposição minha. O único traço autobiográfico declarado está em Espatódea, música em homenagem a sua filha mais nova, a ruivinha Zoe. Caneco 70 é da prole de músicas com letras longas e difíceis de Nando, mas que mesmo assim, o cotidiano narrado é facilmente digerido e cantarolado. Cotidiano esse, aliás, uma forte características das canções reisianas. Mas, é assim mesmo, pela identificação mais casual, que elas nos tocam. N, Nos Seus Olhos e Sim vão entrar para trilha sonora dos apaixonados. Para os momentos de crises existenciais aconselho Para Luzir o Dia e Como Se O Mar, que com frescor trazem cor ao dia-a-dia. Piegas? Meloso? Pois somos.

Fechamos o presente momento musical com o inglês Nick Drake. Nick é um daqueles achados tardios, que você lamenta bastante por não ter ouvido antes. O cantor nem fez lá muito sucesso de massa na sua época (anos 60, 70), mas também a concorrência era grande. Ele também integrava o grupo dos gênios atormentados, e suicidou-se aos 26 anos de idade. Seu legado? Apenas três discos, recheado de ótimas e tristes canções. Para se iniciar em Nick Drake, indico Pink Moon e Suicide Is Painless. É impressionante a suavidade que ele canta versos tão cortantes, doce e amargo, e por muitas vezes sucinto, como nas três frases de Know. A sua obra é marcada pela melancolia, a busca de vencer a dor ("suicide is painless "), a não inadequação ao meio, a inquietação existencial, tudo isso reflete em seus versos depressivos: "the game of life is hard to play...". É, ás vezes uma canção pode servi de consolo, de alívio imediato.

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